Enviromail Brasil 32 - PFAS: Os diferentes lados da resistência

Análise de PFAS e seus impactos no meio ambiente

28 NOV 2023 João Paulo Ferreira

A Resistência

Ao procurar pela definição da palavra “resistência”, é possível encontrar duas citações. E dependendo da sua aplicação, pode-se entender como boa ou ruim:

“Ato ou efeito de resistir”
Esse produto tem o efeito de resistir a praticamente tudo, mantendo-se resistente onde permanece aplicado. Isso pode parecer incrível em alguns produtos, mas com certeza não é tão incrível para o corpo humano.

“Propriedade de um corpo que reage contra a ação de outro corpo”
A propriedade de um corpo resistir a ação de outro pode ser fascinante. Imagine um produto que dura muito tempo, que resiste a impactos, que aguenta a ação de altas temperaturas e suporta a ação de outros compostos, como ácidos. Inegavelmente um material vantajoso.

Esse é o resumo do PFAS e os seus impactos no meio ambiente. Para entender esse problema, primeiro é preciso entender o que são esses compostos e o que eles têm de tão resistente e de importante.

Os Lados

A ciência está em uma busca constante por materiais que possibilitem o desenvolvimento de ferramentas que facilitem o cotidiano e melhorem a qualidade de vida do ser humano. Foi na busca por um gás eficiente para utilização em refrigeradores, que acidentalmente, em 1938, o Politetrafluoroetileno (PTFE) foi sintetizado. Esperava-se um gás, mas obteve-se um material branco e escorregadio. Em 1942 a “Kinetic Chemicals” patenteou o PTFE e registrou a marca como “Teflon” em 1945.

É bem provável que você já tenha ouvido o nome Teflon, afinal esse material é muito utilizado em materiais do seu dia a dia, como: panelas e frigideiras antiaderentes, próteses, coletes à prova de balas, retardantes de chamas e outros. Apesar de sua importância consolidada em seus 70 anos de existência no mercado, o Teflon é só a ponta e um iceberg de pura resistência de um grupo de 4.000 a 5.000 compostos conhecidos como PFAS.

A Estrutura da Resistência

Para entender os problemas atrelados aos PFAS, é preciso entender o que eles são. Ao observar um composto orgânico simples, apresentando apenas carbono e hidrogênio, utilizando o etano e um hidrocarboneto encontrado na natureza. Em sua estrutura há dois carbonos e seis hidrogênios. Substitua quatro dos hidrogênios por flúor e assim você terá o tetrafluoretano.
Agora, os dois hidrogênios que sobraram, podem ser substituídos por dois tetrafluoretanos produzidos anteriormente, ou seja, você terá uma cadeia de tretafluoretanos ligados entre si. Esse processo pode ser repetido para aumentar a cadeia de ligações entre tetrafluoretano. Esse processo é chamado de polimerização, e, portanto, o nome agora do composto será o politretafluoretano, PTFE ou teflon. A reação para a formação não é bem assim e nem tão simples. O conceito baseia-se em substituir hidrogênios por flúor e juntar cada unidade entre si.

A mesma ideia pode ocorrer com diversas cadeias que possuem hidrogênio e carbono. Os PFAS são geralmente divididos em dois grupos, aqueles com sete ou mais ligações carbono-flúor (cadeia longa) e aqueles com menos de sete ligações (cadeia pequena). É possível ter outros átomos diferentes, como no caso dos PFOS (Ácido perfluoro-octanossulfônico), onde há oxigênio e enxofre. Em todo caso, eles também obedecem a ideia de inserir flúor na estrutura, no lugar de hidrogênios.

O importante é destacar que não existe a formação natural dessas estruturas com flúor nessas quantidades. Esse processo demanda energia e não ocorre espontaneamente. E, se ele não ocorre naturalmente, biologicamente não há outras formas para a decomposição desse material. A humanidade acabou desenvolvendo outras formas para lidar com elas. Afinal de contas, se ele não é natural, por que existiria algum microrganismo para lidar com elas? Por qual motivo um corpo desenvolveria formas de quebrar e destruir esses tipos de compostos? E se esse composto fosse ingerido por alguém? Se não forem expelidos, tendem a se acumular no corpo humano, uma vez que não podem ser decompostos.

Os PFAS são resistentes e podem ser acumulados nos organismos. O ser humano está ingerindo PFAS de diferentes formas e lugares, e isso terá consequências. Estas preocupações que abordam a ingestão por meio de panelas e frigideiras antiaderentes riscadas no Enviromail Nº 24 – PFAS: O que são e por que devemos nos preocupar? 

PFAS no Meio Ambiente

Você já percebeu que os PFAS são extremamente estáveis e excelentes matérias para uso das mais diversas áreas industriais, podendo ser encontrados em eletrônicos, produtos têxteis, embalagens e em muitos outros produtos além dos que já foram citados acima. Com uma lista extensa de aplicação em diversos produtos, pode-se deduzir também que, proporcionalmente, há muito descarte e poluição atrelada aos PFAS. São muitos os locais onde podem ser encontrados, acumulando-se no meio ambiente durante a produção, uso e descarte. Esses produtos estão presentes no abastecimento de água, frutos do mar e biossólidos usados na agricultura. Além disso, essas substâncias se acumulam nos sistemas de plantas cultivadas em solo contaminado e animais que consomem água contaminada. Dada a importância, a ONU - Organização das Nações Unidas divulgou sua avaliação dos perigos para o ácido perfluorooctano sulfônico (PFOS) em 2002. Concluiu-se que apresentam bioacumulação em organismos vivos e toxicidade para espécies de mamíferos, causando câncer de fígado e tireoide. O relatório indicou que a exposição ao PFOS também está ligada ao câncer de bexiga. Trabalhos recentes ligam o PFOS à: níveis elevados de colesterol, prejuízo ao metabolismo da glicose, aumento do índice de massa corporal, prejuízo da função tireoidiana, infertilidade e maior prevalência de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. Em 2003, os EUA encontraram PFOS em 98% da população testada. Como resultado destas e de outras investigações, as vendas de PFOS foram restritas em 2006 a “usos essenciais” na Europa e em 2009, o PFOS foi adicionado à lista da Convenção de Estocolmo sobre poluentes orgânicos persistentes.

Para entender melhor este problema, veja os dados a seguir:

  • Em relação as emissões no ambiente, estima-se que entre 1970 e 2002 as emissões diretas e indiretas de PFOS foram de 450 a 2.700 toneladas. Para os PFCAs, são estimadas em 3.200 e 7.300 toneladas de emissão, entre 1960 e 2002.
  • Entre os anos de 2003 até 2008, o Brasil estava entre os cinco maiores produtores de compostos precursores de PFOS e era o terceiro em nível de utilização, atrás apenas da China e Bulgária.
  • De uma forma geral, os PFAS, sobretudo os PFAAs, possuem elevada solubilidade em água quando comparados a outros compostos orgânicos e são mais fáceis de serem encontrados dissolvidos, podendo mais rapidamente serem transportados no meio ambiente.

A ALS e as Análises de PFAS e PFOS no Brasil

Em virtude de suas estruturas, esses compostos não podem ser encontrados naturalmente, e isso facilita identificá-los mais rapidamente em laboratório. Como suas estruturas são únicas, há poucas interferências de compostos que poderiam ser parecidos, gerando uma análise “falsa”, como uma detecção errônea de um composto que se passaria por um PFAS (falso-positivo). Por se tratar de um composto que apresenta uma interação maior com a água e baixa volatilidade, é possível utilizar-se da separação dos compostos por cromatografia de alta eficiência ou HPLC. Essa é uma técnica muito eficiente e que permite separar compostos diferentes de forma robusta. Juntamente com o HPLC, há um detector de massas acoplado, permitindo detectar esses compostos e quantificá-los em concentrações de nanogramas por litro. Um detector de massas permite elucidar um composto químico a partir da massa residual do padrão de fragmentação da molécula.
A ALS Ambiental possui equipamentos de HPLC-MS-MS, ou seja, um cromatógrafo acoplado a dois detectores de massas (duplo quádruplo).

A presença de um equipamento com dois detectores de massas, garante a confirmação do composto, uma vez que consegue detectar com alta sensibilidade, e em sequência, as massas de fragmentações do composto de interesse. Cada PFAS possui uma estrutura característica e, portanto, massas específicas. Caso se fragmente em partículas menores e com massas próximas de outros tipos de PFAS, ainda é possível identificar um padrão de quebra dessas moléculas a partir de um segundo detector, obtendo assim mais informações sobre quem foi o PFAS precursor. Essa é uma classe de HPLC extremamente atual e robusta, que garante exatidão, precisão e baixo limite de quantificação na análise.

Esses compostos só existem há 70 anos. É um tempo muito pequeno quando comparado a outros. Apesar de ainda não existir regulamentação para matrizes ambientais no Brasil, esse cenário tende a mudar. As legislações ambientais estão se adaptando ao tema, dada a importância, e o assunto está cada vez mais em foco, afinal é muito preocupante. Mesmo que ainda não exista um consenso de legislações, deve-se manter o controle e tratamento de descarte de produção e subprodutos que apresentem PFAS, bem como a avaliação do meio ambiente, como águas e solos, para evitar contaminações. Por exemplo, o PFOA e o PFOS são citados na Convenção de Estocolmo.

O PFOA está listado no Anexo A, que se refere à eliminação da produção e do uso das substâncias da lista; o PFOS está listado no Anexo B, que se refere à restrição de produção e uso das respectivas substâncias químicas. No Brasil, a ALS foi um dos primeiros laboratórios ambientais a buscar as acreditações necessárias como diferencial para atender as necessidades do mercado. Desde 2022, já possui um escopo com mais de 31 compostos para PFAS (em águas, efluentes, solos e sedimentos) acreditados pela CGCRE (Coordenadoria Geral de Acreditação do INMETRO) para Ensaios sob número CRL 0222.

Confira a lista de compostos e seus limites de quantificação realizados na tabela a seguir.

Composto Unidade Limite de Quantificação Matriz
PFOA (Perfluorooctanoic acid) ng/L 2 Água
PFOS (Perfluorooctane sulfonic acid) ng/L 2 Água
6_2FTS (6_2-Fluorotelomer sulfonic acid) ng/L 2 Água
8_2FTS (8_2-Fluorotelomer sulfonic acid) ng/L 2 Água
FOSA (Perfluorooctane sulfonamide) ng/L 2 Água
MeFOSA (N-Methyl perfluorooctane sulfonamide) ng/L 2 Água
EtFOSA (N-Ethyl perfluorooctane sulfonamide) ng/L 2 Água
MeFOSE (N-Methyl perfluorooctane sulfonamidoethanol) ng/L 2 Água
EtFOSE (N-Ethyl perfluorooctane sulfonamidoethanol) ng/L 2 Água
PFBS (Perfluorobutane sulfonic acid) ng/L 2 Água
PFHxS (Perfluorohexane sulfonic acid) ng/L 2 Água
PFDS (Perfluorodecane sulfonic acid) ng/L 2 Água
PFBA (Perfluorobutanoic acid) ng/L 2 Água
PFHxA (Perfluorohexanoic acid) ng/L 2 Água
PFHpA (Perfluoroheptanoic acid) ng/L 2 Água
PFNA (Perfluorononanoic acid) ng/L 2 Água
PFDA (Perfluorodecanoic acid) ng/L 2 Água
PFUnDA (Perfluoroundecanoic acid) ng/L 2 Água
PFDoDA (Perfluorododecanoic acid) ng/L 2 Água
PFTrDA (Perfluorotridecanoic acid) ng/L 2 Água
PFTeDA (Perfluorotetradecanoic acid) ng/L 2 Água
PFHxDA (Perfluoro-n-hexadecanoic acid) ng/L 2 Água
4_2FTS (4_2-Fluorotelomer sulfonic acid) ng/L 2 Água
10_2FTS (10_2-Fluorotelomer sulfonic acid) ng/L 2 Água
PFPeA (Perfluoropentanoic acid) ng/L 2 Água
PFPeS (Perfluoropentane sulfonic acid) ng/L 2 Água
PFHpS (Perfluoroheptane sulfonic acid) ng/L 2 Água
EtFOSAA (N-Ethyl perfluorooctane sulfonamidoacetic acid) ng/L 2 Água
MeFOSAA (N-Methyl perfluorooctane sulfonamidoacetic acid) ng/L 2 Água
PFOS-13C4-SUR (Perfluoro-1-(1,2,3,4-13C4)octane sulfonate) % - Água
PFBA-13C4 SUR (Perfluoro-n-[1,2,3,4-13C4]butanoic acid) % - Água
PFHxDA-13C2 SUR (Perfluoro-n-[1,2-13C2]hexadecanoic acid) % - Água

 

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Para dúvidas ou informações sobre as análises PFAS realizadas no Brasil, escreva para ambiental.br@alsglobal.com